Idade Média?

“Idade Média”, ”História Medieval” ou “Medievo” são referências a um período da história europeia, compreendido entre os séculos V e XV. Transição da Antiguidade para a Modernidade.
A Idade Média foi um período de intensas transformações. Há um novo sistema econômico, baseado no campo, o feudalismo, que não se aplicara de forma igual em todos os lugares; divisões religiosas, presentes dentro da Igreja Católica e no Islamismo; revoltas camponesas que objetivaram melhores condições de vida; intensas disputas por poder, por ascensão hierárquica; guerras por questões religiosas e econômicas e tantos outros fatores, por vezes ocultos por um saber estereotipado do período, restrito à cegueira mística do domínio religioso ou ao encantamento inventivo da sociedade cavalheiresca, seus castelos, lendas e maravilhas.
Na sociedade contemporânea, há uma grande valorização desse período, sobretudo na indústria cinematográfica. A presença de filmes com essa temática é a cada dia mais comum. E junto com esta “febre de Idade Média” em Hollywood, nascem algumas questões: Em que medida esses filmes nos ajudam a compreender a história medieval? Como devemos assisti-los? De forma passiva, como puro entretenimento? Certamente não. Ou, pelo contrário, como críticos intolerantes, cobrando-lhes a precisão dos textos acadêmicos? Tampouco. Talvez mais do que buscar fidelidade absoluta à historiografia, possamos encontrar nestes filmes faíscas para um debate em sala de aula: que imperfeições merecem ser problematizadas? Quais imagens ajudam a melhor assimilar lógicas distantes de um passado longínquo? Como transcender uma interpretação exclusivamente narrativa dos filmes para ir ao encontro de indícios de sua produção, relacionados, portanto, ao presente em que foram feitos, o que os torna não mais uma forma de historiografia, mas documentos, fontes para uma história do tempo presente.
Conhecer a “Idade Média dos dias de hoje” – a ideia que dela se faz atualmente – é um desafio que pode ser vencido através de um contato mais efetivo com a filmografia que a cerca. Mais do que conhecer as dinâmicas daquele período distante que demarca o nascimento do Ocidente, é preciso questionar também os usos do passado que cercam o “momento medieval” na contemporaneidade.
Por Professor Marcelo Robson Téo,
Lucas Kammer Orsi,
Lucas Santos

Tristão & Isolda (2006)

Filme: Tristão & Isolda (2006)
Diretor: Kevin Reynolds
País: EUA
Idioma original: inglês
Duração: 125 min.
Gênero: romance



Sobre o diretor:
Kevin Reynolds (1952) é um diretor, roteirista e ator, norte-americano, conhecido por rodar longas-metragens inspirados em obras literárias épicas, como é o caso de Robin Hood, O Conde de Monte Cristo, Waterworld entre outros. O resultado de seu trabalho como diretor de cinema, divide opiniões entre os críticos da sétima arte, alguns consideram que o diretor Kevin Reynolds “está acostumado a esconder-se atrás de conceituados tratados literários para dar a estas obras-primas um resultado tímido e opaco” ou ainda que suas obras “ilustram este caminho em que o discurso fala mais alto do que as imagens”, outros como o renomado produtor Ridley Scott ao falar sobre o filme, do qual foi diretor executivo, “admite sentir-se atraído pela natureza trágica da história de amor que, segundo ele, é tão intensa que transcende qualquer cenário ou época.”


Filmografia :
Como diretor:
2006 - Tristan & Isolde (ou Tristan & Isolde)
2002 - The Count of Monte Cristo ( O conde de Monte Cristo)
1997 - One Eight Seven (O código / pt: Condenação à morte)
1995 - Waterworld (Waterworld – O segredo das águas / pt: Waterworld)
1994 - Rapa Nui (Rapa Nui - uma aventura no paraíso / pt: Rapa Nui)
1991 - Robin Hood: Prince of Thieves (Robin Hood - O príncipe dos ladrões)
1988 - The Beast (A fera da guerra / pt: A besta da guerra)
1985 - Fandango - ( Fandango)
1980 - Proof

Como roteirista
1994 - Rapa Nui (roteiro e história)
1985 - Fandango
1984 - Red Dawn (roteiro e história) (br / pt: Amanhecer violento)
1980 – Proof

Sobre a lenda medieval que inspirou o filme :
A Lenda de Tristão e Isolda é um mito típico do imaginário medieval, supostamente de origem celta, foi difundido na Europa a partir do século XII. A história trata do amor proibido entre dois jovens, que se apaixonam à primeira vista após terem tomado uma poção mágica, oferecida por engano pela dama de companhia de Isolda, e que estava destinada à jovem e ao Rei Marcos da Cornualha, a quem sua mão estava prometida, a pedido do próprio Tristão, sobrinho do Rei Marcos, após ter salvo das garras de um dragão, a vida da filha do rei da Irlanda. Fortemente atraídos e sentindo um amor irresistível, os jovens tornam-se amantes.
Tristão e Isolda são heróis emblemáticos da Idade Média e sua lenda marcou profundamente o imaginário europeu. A imagem do casal e do amor foram muito influenciadas por ela, mas também à ideia da fatalidade da paixão associada ao adultério e, por fim, da relação entre o amor e a morte.
O mito oferece, melhor do que qualquer outro, a imagem medieval da mulher, da vida conjugal, e de um sentimento que também é revelado (talvez com maior intensidade) pelo casal Lancelot e Guinevére , e diz respeito ao valor afetivo que a Idade Média legou ao Ocidente: o amor cortês.
Foi por meio de um conjunto de textos escritos em versos, por Thomas entre 1170-1173 na Inglaterra , que se conheceu os primeiros relatos dessa fascinante história, recriada desde então pelos mais diversos autores, servindo de inspiração para a criação de poemas, peças de teatro, óperas e filmes no séculos XX.
Curiosidade:
Em 1854, o mito ganha uma nova vida, graças à música de Richard Wagner, que elaborou o primeiro projeto de um Tristão e Isolda e, sob a influência de Schopenhauer, acentuou o caráter trágico e pessimista do mito, escrevendo ele mesmo, como de hábito, a letra e a música ao mesmo tempo. Ele terminas Tristão e Isolda em 1859-1860, e a primeira representação acontece em 1865, no Hoftheater de Munique, sob a direção de Hans von Bülow no momento em que Wagner torna-se amante da mulher deste último, Cosima, filha de Liszt – da relação deles nasce uma filha, à qual eles dão o nome de Isolda”. 
Fonte: Jacques Le Goff – Heróis e maravilhas da Idade Média (p.277)

O filme:
Após a queda do império romano, a Europa passa por um período de intensas lutas entre povos rivais. Tristão (James Franco) é um jovem bretão, que após ter todos os membros de sua família assassinados, é adotado por seu tio, Lorde Mark (Rufus Sewell), que o cria juntamente com seu filho natural, e o treina para ser um grande guerreiro. Ferido em combate o jovem é considerado morto e seu corpo é lançado ao mar em um funeral viking. O barco que levava Tristão, é resgatado por Isolda (Sophia Myles), e desse encontro surge uma grande paixão, mas no período em que permanecem juntos, não revelam seus verdadeiros nomes e Isolda, prometida em casamento a um dos principais combatentes de seu pai, esconde que é filha do rei da Irlanda, principal inimigo do Lorde Mark. Após a morte do pretenso noivo de Isolda, um campeonato de lutas é estrategicamente organizado por Donnchadh, o rei irlandês, onde promete como prêmio ao vencedor, a mão de sua filha em casamento. O resultado do campeonato sela o destino dos jovens amantes. Tristão, tentando a recompensar seu Tio pelos anos de dedicação à sua criação, mesmo após a morte de sua esposa, ganha a mão de Isolda para que Lorde Mark venha a desposá-la. É a partir desse cenário, envolvendo uma ardente história de amor, traição e muitas batalhas, que a história do filme se desenvolve.
O filme explora perspectivas muito mais próximas da realidade moderna e do clichê  hollywoodiano, do que do contexto da época em que a lenda medieval celta da se originou. Há uma grandiosidade em torno das sangrentas batalhas, que envolvem uma enorme concentração de soldados e força bélica de ambas as partes. Uma forte parcialidade também é percebida ao retratar o nobre Bretão, Lorde Marcos, como um homem sábio, virtuoso e diplomático, que governa sobre um povo cortês, solidário e muito feliz, em detrimento da imagem grotesca e malvada dos Irlandeses, cujo líder é retratado como inescrupuloso e sanguinário.
Muito embora a obra seja baseada em uma lenda medieval, a reconstituição histórica, está longe de apontar para esta direção. O diretor não valoriza a natureza contemplativa característica do período, e sacrifica as cenas que tratam do conflito vivido pelos amantes em prol de uma narrativa moderna e dinâmica, e sequências intermináveis de lutas. Decisivamente, não se trata de um filme digno de ser relembrado e citado como referência para se pensar o imaginário medieval, embora, com um pouco de esforço e boa vontade, possamos encontrar elementos que tratam o amor como um símbolo fatal que leva ao desvario, traição e morte, tal qual proposto pelo mito original, talvez esse seja o único elo de ligação com a tragédia medieval que inspirou tantas obras magníficas.
Por Flávia de Freitas Souza
Aluna do curso de História FAED – UDESC